27/12/2007

A Vida dos Outros (trailer, post abaixo)

25. A Vida dos Outros (filme)

Deveria ser blog de comida-bebida. É uma exceção. A Vida dos Outros (Das Leben der Anderen, 2006, escrito e dirigido por Florian Henkel von Donnersmarck) é um filme soberbo. Para mim, ele somente poderia ser exibido entre os dias 26 e 31 de dezembro -- porque faz você renovar a fé, seja ela nas pessoas, nas ideologias, ou na simples esperança de que ao alcance de cada um está a possibilidade de se fazer algo grandioso. "Este é para mim" é uma frase que nunca antes no cinema teve tanta força.
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O longa levou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro deste ano e estreou dia 30 de novembro em São Paulo. A história: um metódico oficial da Stasi (a polícia secreta da ex-Alemanha Oriental) passa a vigiar um escritor e inicia, a partir dessa vigília, uma rara experimentação de afetos e emoções que o farão questionar a própria vida e sua fé política. O papel do agente é do espetacular ator Ulrich Mühe. Coincidentemente, ele foi espionado pela Stasi nos anos 80 (a Alemanha Oriental deixou de existir em 1989, com a Queda do Muro de Berlim) e chegou a declarar recentemente que sua segunda ex-mulher, a atriz Jenny Gröllmann, foi informante da Stasi, sem que ele soubesse, enquanto foram casados -- o que ela sempre negou. Os dois morreram de câncer. Ela, em agosto de 2006 (com 59 anos); ele, em julho de 2007 (com 54 anos).

24. Spadaccino (Itália pelo Norte)

Em 2008, o Spadaccino fará 10 anos de vida. "Cent'anni!", porque merece. Se o Buttina (veja post abaixo) nasceu para zelar pelas receitas sulistas, o Spadaccino (rua Mourato Coelho, 1267, tel 11 3032.8605) é guardião das receitas da Emilia-Romagna. É um achado na Vila Madalena, comandado pelos irmãos Paula e Roberto Lazzarini, ex-esgrimistas (spadaccino em italiano é esgrimista). Ambientação. Sou fã. Toda vez que estou lá, viajo para o interior de um antigo e tradicional sobrado italiano. Tento ficar numa das quatro mesas do fundo, junto à fonte. Se a turma for grande, o ideal é optar pela mesa do salão principal. Há ainda um aconchegante segundo piso e mesas na parte da frente. Atendimento. Muito bom. A maior parte dos garçons está ali há alguns anos, o que garante a correção e a rapidez. E a simpatia na medidade certa. Cozinha. Uma das coisas que mais me atrai no Spadaccino é que de tempos em tempos há festivais -- da alcachofra, de carne de caça... Isso ajuda a diversificar o cardápio. Deste, costumo pedir a deliciosa Cotoleta di Vitello com tomate assado recheado e rúcula. Na última visita, provamos (eu e Signora P) o Nero D'Avola Kailà 2004, que passa dois meses em barricas de segundo uso, o deixando leve e saboroso. Se fosse um filme, o Spadaccino seria menos de Fernando Meirelles e mais de Eduardo Coutinho. Você até pode sentir falta de certa dramaticidade, mas nunca vai se decepcionar.
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Relação vinho x importadora (ótima: 11% a 20% mais caro):
Nero D'Avola Kailà 2004 Sicilia (produtor Fatascià)
19% mais caro na carta (67 reais) que na importadora (56,40 em 28.12.2007)

23. Buttina (Itália pelo Sul)

Uma fotógrafa, um músico, uma cozinha despretensiosa e muita honestidade. Com esse enxuto cardápio, o casal Filomena Chiarella e José Otávio Scharlach abriu há 12 anos (1996) o Buttina (rua João Moura, 976, tel 11 3083.5991, Pinheiros). A meta -- se restringir a uma gastronomia italiana sulista -- raramente é quebrada, mas quando isso acontece, vá de olhos fechados (leia-se pedir o campeoníssimo Gnocchi Mineirinho, com tomate, cebolinha, queijo minas e azeite). E não importa o que você devore, se estiver por lá nos fins de semana, inclua na comilança a Pastiera di Grano, uma das melhores sobremesas de toda a cidade. Parte das receitas sai das mãos de Maria Palumbo, mãe de Filomena, e não está disponível todos os dias. Eu e Signora P freqüentamos o Buttina desde o ano 2000. Acabamos de almoçar lá. Sou fã do orecchiette com calabresa. Signora P é adepta dos gnocchi. Desta vez, pedi um fino filé à milanesa com espaguete ao alho e óleo. Signora P foi de risoni com minimedalhões ao pesto, tudo na companhia de um delicioso e surpreendente, apesar de bem suave, Rioja Berceo Crianza 2002 (tempranillo, graciano e mazuelo), 75 reais na carta, 55 reais na importadora.
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Ambientação. O Buttina ocupa um sobradão em Pinheiros, com quintal à antiga: no fundo, cheio de árvores. As mesas da parte de trás da casa, em especial as do mezanino ou sob as jabuticabeiras, costumam ser as primeiras a encher. E são mesmo uma delícia. Atendimento. Equipe jovem e muito simpática, mas em fins de semana de mais movimento você corre o risco de esperar demais -- especialmente se ficar no quintal. Cozinha. É o ponto alto. Gnocchi como pouco se acha na cidade, orecchiette feito a mão.
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Relação vinho x importadora:
Rioja Berceo Crianza 2002 75 reais.
36% mais na carta que na importadora

20/12/2007

22. Bordeaux et Bourgogne

Na foto, rótulo de 110 anos (1898) do
Premier Grand Cru Lafite-Rothschild
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Difícil se aventurar pelo terreno das classificações de vinhos franceses. Cada região adota a sua, o que pode levar a certa confusão. A primeira norma surgiu em 1855. Ainda perde para o Douro, a primeira região demarcada do mundo (1756). O que temos de mais relevante na França?
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Bordeaux
O grupo mais tradicional é o Bordeaux Grand Cru Classé (dividido de premier cru a cinquième cru), mas há também Crus Bourgeois, Crus Artisans, Saint-Emilion e Graves, cada um deles com suas divisões. Entre os Grands Crus, há 5 Premiers Grands Crus, 14 Deuxièmes, 14 Troisièmes, 10 Quatrièmes e 18 Cinquièmes. Os Premiers Grands Crus: Château Lafite-Rothschild (Pauillac), Chäteau Latour (Pauillac), Château Margaux (Margaux), Château Mouton-Rothschild, desde 1973 (Pauillac) e Château Haut-Brion (Pessac). Muitas vezes, eles não trazem no rótulo a denominação Premier Cru ou Deuxième Cru (pode vir apenas Grand Cru Classé ou mesmo nada). O ideal é você ter anotado os nomes dos chateaus.
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Borgonha
Aqui é diferente. Existe uma espécie de lista dos tops, com 33 designações -- são microrregiões/vinhedos -- que recebem o nome de Grand Cru . Ao contrário dos Bordeaux, em que a lista se refere somente a produtores, na Borgonha a divisão é física e as 33 áreas sediam vários produtores (os Grands Crus respondem por 2% dos vinhos da Borgonha). Depois, vêm os Premiers Crus (12% da produção total). A seguir, os classificados como Village, também conhecidos por Commune (36% da produção), e os AOC Bourgogne (que respondem por metade da produção).
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A confusão é grande porque enquanto um Premier Cru é topo de linha em Bordeaux, ele seria um segundo escalão quando se trata da Borgonha -- onde primeira linha são os Grands Crus. Para bagunçar ainda mais, em Saint-Emilion, por exemplo, os grandes vinhos são divididos em Premier Grand Cru Classé A, Premier Grand Cru Classé B e Grand Cru (que é na verdade o terceiro nível). Confuso? Pode ser, mas fascinante.
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Bordeaux - Borgonha
Premier Grand Cru Classé # Grand Cru
Deuxième Grand Cru Classé # Premier Cru
Troisième Grand Cru Classé # Village ou Commune
Quatrième Grand Cru Classé # AOC Bourgogne
Cinquième Grand Cru Classé #

21.Primitivo di Manduria (Pervini)

Não é sempre que se acha um bom vinho de quase nove anos e ainda abaixo dos 100 reais em cartas de restaurantes. Na noite de 19 de dezembro, jantei no Matterello com a Signora P. Pedimos um Primitivo di Manduria Paesaggio 1999, Pervini (77 reais). O Paesaggio é o terceira linha da Pervini com a primitivo (30% do vinho passa pelo menos seis meses em barrica) -- acima dele ainda estão o Archidamo (40% fica seis meses em barrica) e o Primo Amore (100% estagia 1 ano em barrica). Nosso receio é que não tivesse agüentado bem o passar do tempo. Que saboroso receio. Assim que aberto, em 15 minutos ele já havia crescido. A cor mantinha alguns traços violetas, apesar de se aproximar do amarronzado (indicando que ainda pode ficar um tanto mais em guarda, mas não convém arriscar demais). No aroma, alguma fruta madura, ameixas... Na boca, estava levemente aveludado e bem persistente. Muito saboroso. ST 7.75/10.0

19/12/2007

20. Pasquale (restaurante)

Quem me deu a dica foi a jornalista Alessandra Porro. Era uma espécie de brincadeira-desafio: descobrir lugares que não tivessem saído na Vejinha. E fomos, eu e Signora P, ao pequeno restaurante da Cônego Eugênio Leite, no quarteirão que sai do cemitério. Não tinha mais de 4 metros de largura. Um balcão à direita de quem entrava, algumas mesas à esquerda e a pequena escada que levava a uma espécie de segundo salão, com 3 ou 4 mesas. Ao todo, não devia comportar mais de 30 pessoas. Assim conhecemos o pequeno Pasquale, em meados de 2003. Seis meses mais tarde, ele foi descoberto pela Vejinha. E o resto virou história.
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Ambientação
O primeiro endereço (o da Cônego) tinha o charme de ser minúsculo, e ostentava certo improviso (inicialmente, por exemplo, os banheiros ficavam no quintal). Na verdade, ele não nasceu restaurante. Em 2001, o pugliese Pasquale Nigro queria apenas produzir e vender antepastos. Abriu uma rotisseria para servir suas sopressatas, berinjelas à barese (com aliche) e caponatas, mas os clientes começaram a pedir um complemento aqui, uns pães dali, um vinhozinho... Pronto, o restaurante estava a caminho. O sucesso o levou a buscar em 2005 um espaço maior, e a grife mudou-se para a ponta do Sumarezinho (rua Amália de Noronha, 167. Tel 11 3031.0333). O novo endereço tem dois pisos, mas quase ninguém quer ficar no andar de cima, tamanho o charme e o clima do térreo. Em dias mais quentes, as mesas do quintal (logo à entrada) são as mais disputadas.
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Atendimento
A brigada de garçons cresceu e quase sempre é muito atenta. Como o consumo de vinho na casa é altíssimo, todos poderão ajudá-lo na tarefa. Da época da Cônego, tem lá o Marcelo, que cuida dos antepastos. E, claro, tem o próprio Pasquale, sua mulher (Cleide) e os filhos (em especial Giorgio). Eles estão sempre no salão, conversando com os clientes, sugerindo pratos, vinhos, antepastos... Em poucos lugares a expressão "você se sente entre amigos" é tão verdadeira quanto ali.
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Cozinha
Bem, tem de ser a grande atração. E é. O cardápio é de trattoria, mas nada ali chegará à mesa como se a pasta estivesse mergulhada numa poça, ou em meio a uma profusão de molho branco, nem você comerá massa que não esteja al dente. Às quartas há um Cabrito com Batata e Brócolis que vale a romaria. Sextas e sábados são dias de Orecchiette à Baccalà. O restante do menu traz outras receitas simples, com bons ingredientes, feitas com correção, sem ser surpreendente -- leva um honroso 8.0/10.0. Já os antepastos... Meu Deus! Prove pelo menos três. Volte outro dia e prove mais três. Faça isso até passar por todos. Antes de se servir de vinho eu arriscaria o Gutemberg (pimenta cambuci com gorgonzola) e o Jiló Picante. Eu só abro mão dos antepastos quando peço como entrada um sanduíche Mediterrâneo fatiado (salame, queijo e alichela no pão italiano). Algumas poucas sobremesas, mas a laranjinha com queijo cremoso justifica tudo. A oferta de vinhos é generosa, eles estão climatizados e tem também sempre um leque de opções em taça.
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Orecchiette, pasta da Púglia
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Relação vinho x importadora:
Arajá 2000 (85% carignano-15% sangiovese, prod. Santadi)
77 reais. 42% mais na carta que na importadora.

18/12/2007

19. Os austeros e atraentes vinhos portugueses e seus nomes maravilhosos

Não há igual. Selecionei a lista a seguir usando nada de critério. Mas não conheço criatividade equivalente para dar nome a vinhos como a dos portugueses (incluindo preciosidades como o lendário Pêra-Manca). Em tempo: tentei evitar rótulos que vêm de referências geográficas ou nomes de lugares como vales, casas, quintas, herdades -- a lista teria outras presenças singelas do tipo Quinta dos Patudos, Quinta do Cachão, Casa dos Zagalos, Herdade das Pias, Monte das Cortiçadas, Quinta do Além-Tanha, Quinta do Corujão, Tapada dos Coelheiros, Outeiro da Águia, Adega de Mêda e outros tantos do mesmo quilate. À lista (com 49 nomes):
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1. Amo-te # 2. Berço do Infante # 3. Boa Memória # 4. Bom Juiz # 5. Bons Ares # 6. Cabeça de Burro # 7. Cabeça de Toiro # 8. Callabriga # 9. Chão Rijo # 10. Desigual # 11. Diga? # 12. Dorna Velha # 13. Egoísta # 14. Entre II Santos # 15. Esboço # 16. Ferrugento # 17. Fonte do Nico Fashion # 18. Gatão # 19. Grande Escolha Bafarela # 20. Guru # 21. Honra da Vinha # 22. Inevitável # 23. Irreverente # 24. Jóia de Família # 25. Lapa do Lobo # 26. Lavradores de Feitoria # 27. Loios # 28. Má Partilha # 29. Meandro do Vale Meão # 30. Meia Encosta # 31. Meia Pipa # 32. Monte Seis Reis Bolonhês # 33. Montinho São Miguel # 34. Outono de Santar # 35. Paciência # 36. Padre Pedro # 37. Pegos Claros # 38. Pêra-Manca # 39. Ping'amor # 40. Poeira Vinhas Velhas # 41. Porca de Murça # 42. Porta Velha Vale Pradinhos # 43. Rapariga da Quinta # 44. Santola Loureiro # 45. Só Syrah # 46. Só Touriga Nacional # 47. Terras do Demo # 48. Tiro pela Culatra # 49. Vinha da Nora


Meu top 5:
5) Má Partilha
4) Pêra-Manca (foto)
3) Só Touriga Nacional
2) Cabeça de Burro
1) Diga?
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Menção honrosa ao produtor Casa Agrícola da Paciência, pelos nomes Paciência, Ping'amor e Tiro pela Culatra.
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Lista dos vinhos com as uvas e os produtores:
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Amo-te (cabernet sauvignon-aragonês-syrah-touriga nacional, produtor Casal do Tojo), Berço do Infante (castelão francês-tinta roriz, produtor Quinta de Cabriz), Boa Memória (aragonês-castelão-trincadeira-cabernet sauvignon, produtor Sociedade Agrícola de Capareira), Bom Juiz (castelão-aragonês-trincadeira-tinta caiada, produtor Carmim), Bons Ares (touriga nacional-cabernet sauvignon, produtor Ramos Pinto), Cabeça de Burro (touriga franca-tinta roriz-tinta barroca, produtor Caves Vale do Rodo), Cabeça de Toiro (joão santarém, produtor Dom Teodósio), Callabriga (tinta roriz-touriga nacional-touriga franca, produtor Sogrape), Chão Rijo (castelão, produtor Adega Regional de Colares), Desigual (alicante bouchet-aragonês-cabernet sauvignon-castelão, produtor PLC Companhia de Vinhos do Alandroal), Diga? (pinot noir, produtor Carlos Campolargo Vinhos), Dorna Velha (tintatroriz-tinta barroca-touriga nacional-touriga franca, produtor Quinta do Silval), Egoísta (trincadeira-aragonês-syrah-alicante bouchet, produtor Esprit du Monde SA), Entre II Santos (baga-castelão nacional-merlot, produtor Carlos Campolargo Vinhos), Esboço (tinta roriz-touriga franca-tinta barroca, produtor Kolheita de Idéias), Ferrugento (touriga nacional-tinta roriz, produtor José Carlos Monteiro Pinto), Fonte do Nico Fashion (moscatel de setúbal-arinto, produtor Adega de Pegões), Gatão (rosê, alvarelhão-tinta carvalha-tinta roriz-touriga nacional, tinta barroca-outras, produtor Borges), Grande Escolha Bafarela (touriga franca-tinta roriz, produtor Brites Aguiar), Guru (branco, não tenho as uvas, produtor Pintas), Honra da Vinha (branco, não tenho as uvas, produtor Quinta das Murtigas), Inevitável (touriga nacional-merlot, produtor Casa de Santa Vitória), Irreverente (touriga nacional-tinta roriz-jaen-alfrocheiro preto, produtor U.d.a.c.a), Jóia de Família (touriga franca-tinta roriz-tinta amarela-tinta barroca-tinta carvalha-tinta francisca-tinta da barca-outras vinhas velhas, produtor Vale do Rodo), Lapa do Lobo (jaen-alfrocheiro-rufete, produtor Sovidão), Lavradores de Feitoria (touriga nacional-tinta roriz-touriga franca-tinta barroca, produtor Lavradores de Feitoria), Loios (castelão-aragonês-trincadeira, produtor J.Portugal Ramos), Má Partilha (merlot, produtor Bacalhôa Vinhos), Meandro do Vale Meão (touriga nacional-touriga franca-tinta roriz-tinta barroca-tinta amarela, produtor Francisco Olazabal e Filhos), Meia Encosta (touriga nacional-alfrocheiro-tinta roriz, produtor Borges), Meia Pipa (castelão-cabernet sauvignon, produtor Bacalhôa Vinhos), Monte Seis Reis Bolonhês (aragonês-alicante bouchet-trincadeira-tinta caiada, produtor Sociedade Agrícola de Capareira), Montinho São Miguel (aragonês-trincadeira-cabernet sauvignon, produtor Herdade de São Miguel), Outono de Santar Vindima Tardia (de sobremesa, encruzado, produtor Sociedade Agrícola de Santar), Paciência (syrah, produtor Casa Agrícola de Paciência), Padre Pedro (aragonês-alicante bouchet-trincadeira-tinta caiada, produtor Casa Cadaval), Pegos Claros (castelão, produtor Quinta da Romeira), Pêra-Manca (trincadeira-aragonês, produtor Fundação Eugénio de Almeida), Ping'amor (tinta roriz-syrah-touriga nacional, produtor Casa Agrícola de Paciência), Poeira Vinhas Velhas (tinta roriz-touriga franca-touriga nacional-tinta barroca, produtor Jorge Moreira), Porca de Murça Reserva (touriga nacional-touriga franca-tinta roriz-tinto cão, produtor Real Companhia Velha), Porta Velha Vale Pradinhos (tinta roriz-tinta amarela-touriga nacional-cabernet sauvignon, produtor Vale Pradinhos), Rapariga da Quinta (alicante bouchet-aragonês-trincadeira, produtor Herdade dos Grous), Santola Loureiro (pedernã, produtor Messias), Só Syrah (syrah, produtor Bacalhôa Vinhos), Só Touriga Nacional (touriga nacional, produtor Bacalhôa Vinhos), Terras do Demo (touriga nacional-touriga franca-alvarelhão-aragonês-tinta barroca-tinta amarela-malvasia preta, produtor Cooperativa Agrícola do Távora), Tiro pela Culatra (merlot-cabernet sauvignon, produtor Casa Agrícola da Paciência), Vinha da Nora (syrah-cinsault, produtor Quinta do Monte d'Oiro)

14/12/2007

18. Casa Flora

Para fazer nosso fim de ano ainda mais feliz, a Casa Flora promoveu, sob o comando do Junior e do Arthur Azevedo (o consultor de vinhos da empresa), uma degustação de ícones de seu catálogo e lançamentos. Foi no Hotel Fasano, em que uma suíte -- a 153 -- ficou à disposição dos entusiastas. Espumantes, brancos, tintos, fortificados... Minha cesta básica com uma dúzia de itens:
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BRANCO
1. Fleur du Cap Semillon 2004 (África do Sul)
Um branco curinga. Mantenha um par destes em casa e nunca passe feio com surpresas de última hora. 46,80 reais. ST 7.5/10.0
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TINTOS
2. Brunello di Montalcino 2001, Camigliano (Itália)
Bem, você sabe do que se trata... Na WS, teve 91 pontos. Por 234 reais. ST 7.0/10.0
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3. Mq. de Borba Reserva 2001, J.Portugal Ramos (Portugal)
Cabernet, Aragonês, Trincadeira e Alicante. Este alentejano é o que se espera de portugueses: robustez. Praticamente o mesmo desempenho por um preço menor que o anterior, 185,20 reais. ST 7.0/10.0
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4. Taurasi 2000, Vesevo (Itália)
Força e equilíbrio sob a mesma guarda num vinho diferenciado. 122 reais. ST 7.5/10.0
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5. Shiraz G.A.M. 2005, Mitolo (Austrália)
Vinho jovem que já mostra a que veio. Frutado -- é do Novo Mundo, ok --, mas na medida. 164,40 reais. ST 7.75/10.0
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6. St. Andrews Shiraz 2001, Taylors (Austrália)
Olha, se tivesse de escolher uma garrafa, levaria esta para casa. Acima de tudo, porque nasci em Santo André... Ok, motivos racionais: mais me impressionou. Mesmo perdendo para alguns clássicos, foi o que me fez pensar, "caraca, ó o que os caras tão fazendo!". 168 reais. ST 7.75/10.0
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7. Mas de Maso, Cellers Capafons-Ossó (Espanha)
Um clássico. Outro curinga. Vai de queijos numa entrada casual a pratos potentes. 155,80 reais. ST 8.0/10.0
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8. I Balzini Black Label 2002 - supertoscano (Itália)
Itália com França. Sangiovese com cabernet e merlot. Na WS, 90 pontos. Prato com carne da culinária italiana, eis seu par perfeito. Vinho de produção limitadíssima. 162 reais. ST 8.0/10.0
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9. Zambujeiro 2003, Quinta do Zambujeiro (Portugal)
Cabernet Sauvignon, Touriga Nacional, Aragonês, Trincadeira, Alicante Bouchet. Parece escalação de uma grande seleção de futebol -- e vamos combinar que não fica muito longe disso. Tem 15% de álcool, e tudo equilibrado (aroma/boca). 372 reais. ST 8.0/10.0
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10. Graves Clos Floridene 2003, Denis Dubourdieu (França)
Sou fã desse produtor. A composição de cabernet sauvignon e merlot tem pouco álcool (12,5%), mas muita personalidade -- ãh!? Ok: aromas intensos, boca aveludada e persistente, sabor em que aparecem frutas, mas também algo picante. 89,70 reais. ST 8.25/10.0
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FORTIFICADOS
11. Sauternes Château Cantegril, Denis Dubourdieu (França)
Com sauternes funciona assim: são vinhos de sobremesa, mais doces e mais alcoólicos, mas com a acidez exata para você não sentir nada enjoativo. 118 reais. ST 7.5/10.0
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12. Pedro Ximenez, Fernando de Castilla (Espanha)
Espetacular. Uma garrafa e um bom livro de mais de 400 páginas. Eles acabarão juntos. E você acabará feliz. Na WS, 93 pontos. 135,50 reais. ST 8.25/10.0
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17. Ora, Pois (restaurante)

Por muito tempo, comer comida portuguesa em São Paulo foi sinônimo de esvaziar os cofres. Duas casas mudaram esse conceito: a Ora, Pois (2000), na Vila Madalena, e a Casa Portuguesa (1997), em Pinheiros. Eu e Signora P freqüentamos o Ora,Pois desde os tempos em que ele ficava na rua Harmonia, ao lado do tradicional boteco Jacaré. Bacalhau bem feito, com guardanapos de pano e alguns bons vinhos a preços muito amistosos. Viramos amigos. Hoje, já instalado na rua Fidalga, vive lotado. Conseguimos lugar no dia 14. Fazia 15ºC no almoço em São Paulo. Dia certo, temperatura ideal e... um Bacalhau Assado com Batatas ao Murro de fazer você desistir de trabalhar à tarde. Pedimos um Monte da Casta 2003 (Castelão e Touriga Nacional), 55 reais na carta, 32 reais no importador. Tinto com fruta na medida limite, muito equilibrado, potente. Lembra a média dos jogadores portugueses: muito esforço, certa técnica.
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Relação vinho x importadora:
Monte da Casta 2003 (Quinta da Lagoalva de Cima)
55 reais. 74% mais na carta que na importadora.

13/12/2007

16. Aguzzo (restaurante)

Tenho uma teoria para prêmios. Se somos vencedores (ou amigos vencem) ele é justo e coerente. Caso contrário, é tudo parcial e sem critério. E as duas coisas estão corretas. Há premiados que põem em dúvida a sanidade do premiador. Mas há aqueles que merecem plenamente o reconhecimento. Coloque o Aguzzo nesta categoria. No próximo Guia Quatro Rodas, edição 2008, ele estreará entre os estrelados. Na cidade de São Paulo, há 74 endereços na lista -- dois têm 3 estrelas, seis têm 2 estrelas e 66 têm 1 estrela. O Aguzzo é uma criança (foi aberto em abril de 2006), só que seu dono tem muita história. Por trás do restaurante está o experiente Osmânio Rezende, com extensas passagens pelo grupo Fasano (Parigi foi o último deles) e Le Coq Hardy. Ele se juntou a dois investidores e trouxe de seu antigo emprego o chef Alessandro de Oliveira. Se você é de São Paulo, não deixe de freqüentar a casa. Se não é, não importa quanto tempo fique e quais endereços procura, vá ao Aguzzo. Ele conjuga os 3 atos que sustentam um excelente restaurante -- 1. ambientação, 2. atendimento e 3. ótima cozinha.

1. Ambientação
Localizado em Pinheiros (rua Simão Álvares, 325), na Zona Oeste de São Paulo, ocupa uma esquina junto àquele charmosíssimo conjunto de predinhos de três andares que cobre cinco quadras do bairro. A casa é pequena (não deve ter mais de dez mesas), com paredes envidraçadas, e faz mais o gênero sóbrio que o informal. Mas não se iluda. Nem há formalidade demais, nem de menos. É tudo preciso e equilibrado.
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2. Atendimento
Para mim, um dos melhores atendimentos da cidade. A sensação é que não há um funcionário cuja preocupação não seja a de fazer você se sentir bem. Vale desde a hora de recebê-lo no valet (há estilo e cavalheirismo nos rapazes que estacionam seu carro), passando pela brigada de salão e culminando, claro, na cozinha. Resumo: ali, quem é o centro das atenções não é o maître, o sommelier, o garçom, ou o chef. É você. Num sábado à noite, cheguei com a Signora P em cima do fechamento. Fomos bem recebidos e o primeiro comentário da equipe, assim que pedi uma água e o cardápio, foi um sincero "fique à vontade". Era evidente que a última preocupação era se eu demoraria ou o quanto gastaria em meu pedido.
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3. Cozinha
Nas três visitas ao Aguzzo, provei três entradas diferentes, pedi três pratos diferentes e devorei três sobremesas diferentes. Não houve um momento de decepção -- bem, talvez um: uma entrada de polenta com gorgonzola que veio quente demais, comprometendo ou o sabor ou, o maior dos desastres, a língua, impedindo que se perceba a riqueza do prato principal e do vinho. Optei por deixar esfriar a entrada já à mesa por alguns minutos. À primeira vista, o cardápio pode parecer enxuto. De novo, não se deixe enganar. Além do que habitualmente é servido, existirá um prato para aquele dia, uma sugestão de ocasião, e vale estar atento.
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Relação vinho x importadora:
Bourgogne Couvin des Jacobins 2002 (Louis Jadot)
129 reais. 70% mais na carta que na importadora.

10/12/2007

15. Borgonhas (Domaine Jacques Prieur)

Casa do Porto, Jardins, São Paulo, 20 de novembro. Nove vinhos seriam degustados, todos do Domaine Jacques Prieur. Borgonha é região para iniciados. Inúmeros produtores, com pequenas áreas, assediados pelos tradicionais negociants... A chance de se pagar muito por qualquer vinho dali é grande e, proporcionalmente, a chance de pegar rótulo ruim é baixa. Mas existe. E não há nada mais chato que queimar uns bons reais por algo que não vale tanto. Como fugir da cilada? Pesquisando muito sobre o vinho e sobre o produtor. O Domaine Jacques Prieur é top entre os produtores mais respeitados. O que provamos?

BRANCOS

1. Clos Mathilde 2004
Cor palha, o que costuma indicar vinhos bem jovens entre os brancos. No aroma, você já sente a fruta, que cresce quando você agita a taça. Na boca, o primeiro contato é seco (mas não áspero), com certo sal. E aí vem a primeira surpresa. O aroma de fruta não aparece na boca, em que o vinho está mais mineral. Decepciona um pouco por não ter muita permanência. Vai bem com... ostras, num pré-almoço, por causa de sua mineralidade, ou morangos, para encerrar a tarde. 99 reais

2. Meursault, Clos de Mazeray 2004
Cor palha mais escura, sinal de mais complexidade que o anterior, apesar de ainda jovem. Aromas minerais, que se confirmam na boca. O primeiro contato é de maciez e a permanência cresce. Ótimo vinho. Vai bem com... folhas verdes e queijo de cabra, numa salada, ou um peixe e molho leve. 327 reais.

3. Puligny-Montrachet, Les Combettes 1er Cru 2003
Aqui a coisa começa a ficar perigosa. Na cor, sai o palha e entra em cena um amarelo firme, embora ainda suave. Se você resolver guardá-lo, ele vai escurecer. No aroma, forte presença de fruta. Na boca, o primeiro contato é aveludado, e o gosto de fruta aparece, mas nada carregado. Boa permanência. Vai bem com... vamos lá, camarões imponentes, lagostas, este é o parceiro perfeito. 546 reais

4. Beaune, Champs Pimont 1er Cru 1999
Tem oito anos, mas ainda um amarelo suave na cor, sinal de que pode segurar um tempo na garrafa. Vale arriscar? Vale. Mas depois de descobrir seus aromas complexos de frutas e minerais (um pouco mais para estes que para aquelas) e até certa canela, ou depois de perceber sua presença (o primeiro impacto é de que o Champs Pimont toma conta da boca), eu não conseguiria esperar. Boa permanência. Vai bem com... saladas, frutas, alguns queijos, peixes, mas não é rótulo para penduricalhos, por isso seria um desperdício fora de um almoço ou jantar. 273 reais

5. Montrachet, Grand Cru 2001
Branco, mas foi o último a ser servido na noite, depois dos quatro tintos abaixo. E não poderia ser diferente. Um Montrachet desse porte faz você entender o que é vinho branco de verdade. Sua cor é amarelo escuro, que indica potência e/ou idade e/ou complexidade. Aromas? Bem, todos os que seu olfato consegue distinguir. De fruta a mineral, especiarias, madeira. O primeiro contato na boca lembra um tinto, tamanha a presença. E tem boa permanência. Vinho espetacular. Vai bem com... Eu tentaria tudo, de atum gordo quase cru a carne de porco com alecrim. 2.893 reais

TINTOS

1. Beaune, Champs Pimont 1er Cru 2002
Sua cor é um vivo violeta, apesar de ter seus cinco anos. Vinho que vai crescer, e muito. No aroma, flores e frutas, mas na boca ele te surpreende: primeiramente, é seco, austero, contradizendo o que o aroma sugeria. Depois, o sabor: nada de fruta - ele vai para o "outro lado" e ganha então um sabor animal, apesar de a fruta permanecer. Esse vaivém entre o que o aroma sugere e o que sabor exalta é típico dos grandes borgonhas. Boa permanência. Vai bem com... queijos a carnes, mas parece nascido para um Filé à Rossini. 254 reais.

2. Clos de Vougeot, Grand Cru 2001
Se você curte futebol, este vinho seria Zidane (e o próximo, o Echezeaux, seria Platini). Um craque. A cor é grená, como a camisa do Juventus da Mooca, ou do Torino, claro. No aroma: frutas vermelhas, quase compotas. Na boca: o primeiro contato é mais para o seco, e o vinho preenche a boca totalmente. O sabor: complexo. E o que significa complexo? Significa um vinho cujo primeiro sabor é um, depois aparece outro, mais cinco minutos e vem o terceiro... No caso deste Grand Cru, no início chega a fruta, depois outra fruta, mais uma... Ótima permanência. Vai bem com... se recomendei Filé à Rossini antes foi para guardar o Boeuf Bourguignon para este. Um excelente borgonha para um tradicional prato da Borgonha. 527 reais

3. Echezeaux, Grand Cru 2001
Aquela cor grená marcante, aromas de frutas vermelhas, não tânico, não seco, toma conta da boca - demonstra ótima permanência - e entrega sabores que vão de frutas a ervas verdes. Bem, "entregar" não é bem o termo, os sabores mais lembram soldados no desembarque da Normandia: é uma invasão. Não se intimide com o primeiro gole. Ele vai crescer e mudar a cada taça. Se resolver guardar, poderá se tornar um vinho espetacular. Mas já se trata de um puro-sangue. Se for tomar agora, abra a garrafa pelo menos 30 minutos antes de servir. Vai bem com... qualquer grande prato, qualquer queijo forte. Para mim, foi o vinho da noite - especialmente pelo potencial que tem para daqui a alguns anos. 891 reais

4. Musigny, Grand Cru 2001
Seu vermelho escuro, a caminho do marrom, mostra que ele tem envelhecido bem. No primeiro contato de boca, não ofende (tecla sap: você não sente a boca secar imediatamente) e os sabores aparecem, todos juntos, as frutas, alguma especiaria, madeira. Tudo em perfeita harmonia. E a permanência é longa, ótima. Vai bem com... assim que provei este vinho lembrei-me do Cotechino e Zampone con Lenticchie (embutidos italianos com lentilha) do excelente Aguzzo (São Paulo). 1.255 reais.

14. Analisando um vinho

Não tenho técnica. Sigo instintos. E provo muito. Isso basta. Ainda assim, criei um roteiro para as degustações de que participo. É uma coisa bem simples (então, muita gente deve fazer o mesmo há muito mais tempo que eu -- se for o caso, sinta-se homenageado, não tenho a pretensão de inventar a roda aqui).

BRANCO & TINTO
(antes, por favor, leia o post abaixo, o 13).

1) Análise Visual, que divido em duas:
a. Cor (imagine uma escala do palha ao amarelo ouro, para os brancos, ou do vermelho ao rubi, do grená ao marrom, para os tintos). b. Transparência (menos turvo e mais límpido, melhor)
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2) Análise Olfativa
Não tenho capacidade olfativa além de medíocre. Entre os brancos, em vez de buscar aromas específicos, tento apenas distinguir se o vinho provado lembra algo mais frutado ou algo mais mineral. Essa é a grande divisão. Em alguns casos, há um surpreendente equilíbrio. Ou, em outros casos, o vinho parece frutado no aroma, mas é mineral na boca. Imagine uma escala de 0 a 10 em que 0 é mineral e 10 é fruta e 5 é o ponto de equilíbrio. Em que casa está o branco que você toma? Se entre os brancos divido em fruta e mineral, para os tintos acrescento duas categorias: aromas animais (vale carne, vale couro) e madeiras/especiarias. Eles podem estar sozinhos ou combinados. Há muito mais aromas tanto para brancos quanto para tintos, claro, mas com esses você já estará bem servido.
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3) Análise de Boca (e Aromática), que divido em três:
a. Contato: o vinho "chega" seco à boca? Ou chega áspero? Suave? Tânico? b. Permanência: quanto tempo ele "fica" em sua boca. Quanto mais, melhor. c. Aroma: o gosto frutado se confirmou ou o sabor parece mais mineral? Se for tinto, está mais para uma carne de caça ou para um gostinho de canela?
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ROSÉ
Só tomo vinho rosé quando é inevitável e soaria deselegante não fazê-lo.

13. Degustação e harmonização

Minhas três regras essenciais:

1. siga sua percepção
2. siga seu instinto
3. não siga regras (muito menos as minhas)

1. "siga sua percepção" significa que o prazer conta mais que a técnica. Isso explica por que muitas vezes temos fome de um nababesco hambúrguer com bacon e não o trocaríamos pelo melhor dia do Jun Sakamoto.
2. "siga seu instinto" significa que você pode (e deve) quebrar regras. Ontem, domingo, preparamos (eu e Senhora P) um fettucine com molho picante de tomate + colita de cuadril ao forno. Sol de quase 30ºC em São Paulo, decidimos ir de espumante (não diga que você leu isso aqui, eu nego). Mas o espumante bem seco estava delicioso, e aquela característica frisante até confrontou em igualdade a força do molho e a rusticidade da carne.
3. "não siga regras" significa não siga regras. Saiba que você pode arriscar tudo. Mais que isso: saiba que, na gastronomia, você realmente D-E-V-E arriscar.

07/12/2007

12. Mario Batali (livro)

Dono de uma porrada de renomados restaurantes de sotaque italiano nos Estados Unidos, Mario Batali virou livro. Em Calor, do jornalista e escritor americano Bill Buford, a singular personalidade de Batali é jogada à luz. De quebra, mergulhamos também na vida de outros tantos caras do mundo das panelas, como o malucaço Dario Cecchini, que vive na Toscana e é considerado o melhor açougueiro do planeta. Mas f*dão aqui é mesmo Buford! O cara já havia passado quatro anos no meio de hooligans para escrever Entre os Vândalos. E passou uma temporada em meio a panelas, fogo e facas para escrever Calor. Depois do livro, você vai sacar que talvez fosse mais fácil ele ter estado outros quatro anos entre os hooligans.

11. Duas dicas em dez linhas

PARA COLECIONADOR - Brunello di Montalcino Tenuta Nuova 2001, Casanova di Neri. Eleito o melhor do mundo na edição 2006 da revista Wine Spectator. Coisa para dar ao melhor amigo no casório (e pedir para beber junto). Expand (11 3847.4747). 780 reais

PARA UMA COMPRA ESPERTA - Nieto Senetiner Bonarda 2004. Seu acervo vai mal, compre um argentino. Funciona no futebol, funciona nos vinhos. Se for da vinícola Nieto Senetiner, então... Casa Flora (11 3327.5199) e Porto a Porto (41 3018.7393). 30 reais

10. Amarone (Bertani)

Existe uma boa razão para qualquer brasileiro passar a ver 1964 como um ano espetacular: o Amarone produzido pela Bertani. Não é um vinho propenso à unanimidade. Ele me lembra o meia Alex (ex-Palmeiras e Cruzeiro, hoje ídolo no futebol turco). Calma lá, vou explicar. Para alguns críticos, Alex é lento. Para outros, um craque. Mas defensores e detratores concordam que se trata de um grande jogador. Assim vale com o Amarone della Valpolicella e seu indefectível aroma de frutas passas. Para alguns especialistas, nunca estará à altura dos grandes Barolos ou Brunellos. Para outros, sua complexidade contém força – demonstrada também no elevado teor alcoólico, que vai dos 14% aos 16%.

Dia 11 de julho de 2007 estive com um restrito grupo de 12 ou 13 pessoas numa degustação vertical de Amarones da Bertani em comemoração aos 150 anos da vinícola. Os Bertani figuram entre os três principais produtores de Amarone e são, com certeza, os mais clássicos – ou conservadores, dependendo do ponto de vista. Provamos oito safras – 1959 (a primeira delas) 1964, 1967, 1968, 1978, 1985, 1995 e 1998. Meu caro...

Vinhos desse porte demoram para ser feitos, demoram para ser abertos, demoram para ser degustados... Ainda bem. A grife Bertani mostra toda a filosofia slow wine nos Amarones. As uvas, de parreiras especialíssimas, são colhidas a mão e descansam meses até quase chegar ao estado de passas. Aí, são observadas por um grupo restrito de cerca de 40 funcionários, verdadeiros mestres que todas as manhãs e tardes dão uma olhadinha para ver como andam as coisas. São pessoas como Remo Brunelli, nome e sobrenome, não apenas um crachá. Tudo sem pressa. Dali as uvas partem para a vinificação – de cada 100 kg, obtêm-se 40 litros de vinho. Depois, são pelo menos cinco anos descansando em barris de carvalho. Eu disse pelo menos cinco anos. A safra 1959, por exemplo, só foi engarrafada em 1987. Isso garante a longa vida desses vinhos.

Você pode encontrar seis das oito safras degustadas nas importadoras Casa Flora (São Paulo) e na Porto a Porto (Curitiba). Estamos falando de vinhos que estão longe do declínio, mesmo os que se aproximam ou já passaram dos 40 anos. Eles demonstram frescor e, em boa parte dos casos, muita vida pela frente. No distribuidor, os preços variam de 270 reais (1995) a 1188 reais (1959). Caro? Bem, beber algo que pode ser mais velho que você tem lá seu preço. Viver a experiência sem provocar um rombo inesquecível no orçamento vale como opção para o dia em que resolver juntar aquela turma de amigos e lembrar os bons tempos – divida a garrafa (e a conta) com os goodfellas!

Em tempo: aguarda-se para breve a assunção dos Amarones, hoje DOC, ao panteão DOCG (Denominação de Origem Controlada e Garantida, lista seleta de 35 eleitos). Merece.

Publicado na revista VIP (agosto/2007)

9. Tannat (Bodegas Carrau)

Você confiaria numa família que há 250 anos está no mesmo ramo de negócios? Eu também. Javier Carrau, que comanda a uruguaia Bodegas Carrau, esteve no Brasil à frente de uma pequena, e excitante, degustação de exemplares de seus rótulos. Sua família comprou os primeiros vinhedos na Catalunha (Espanha) em 1752. Desde então, e por nove gerações, os caras produzem vinho. No Uruguai, para onde imigrou, a grife Carrau se destaca por apostar em tecnologia, mas sempre aliada a uma postura artesanal. Isso significa que o foco não é a quantidade. São vinhedos com baixa produção de litros por hectare, o que costuma garantir safras melhores. E, apesar da produção limitada, suas garrafas têm ótimos preços. Dos vinhos degustados, indico três:

Castel Pujol Tannat de Reserva 2003
Tannat é tanino. Sim, são vinhos que “pegam” na boca. Ideal para pratos fortes. Pense na zaga do Peñarol numa cobrança de escanteio. É quase a mesma coisa... Este passa 14 meses em barricas (1/3 do tempo em barricas novas e 2/3 em velhas, o que ameniza os taninos). Teor alcoólico: 13,5%. Faixa de 50 reais.

Amat Tannat 2002
Recém-eleito pela reevista Wine Spectator o melhor tannat do mundo. Eleições são sempre duvidosas, ok, mas este vinho merece o título. Foram 24 anos de pesquisas para chegar a um exemplar em que o tanino aparece sem amarrar a boca. São 16 meses de barrica e outros 12 meses de garrafa, antes de ir para o mercado. Pode comprar e abrir. Pode comprar e guardar. Ele se sai bem sempre. Teor alcoólico: 14%. Na faixa de 95 reais.

Castel Pujol Sauvignon Blanc Sur Lie 2005
Este branco é para fazer sua garota te amar mais quatro meses, por baixo. Teor alcoólico: 13%. Perto dos 50 reais.

Publicado na revista VIP (agosto/2007)