27/11/2007

8. Talento (Salton)

Meu caro, comemore junto. O Talento 2004 (cabernet sauvignon-malbec-tannat) da Salton acaba de ser incluído na mais recente edição do Atlas Mundial do Vinho, editado por Julia Harding -- Julia é a fiel escudeira da aclamada crítica inglesa Jancis Robinson. Quem consome os rótulos nacionais conhece a qualidade da produção, mas receber o aval de uma publicação renomada mundialmente muda o patamar do vinho brasileiro, abrindo portas para sua exportação em larga escala. Acabei de falar com Angelo Salton Neto, o comandante da casa vinícola, que muito investiu para chegar a esse nível de vinho. "Apostamos numa coisa o tempo inteiro: em qualidade", disse. E isso vale para quem faz vinhos, produz carros, adestra lagartixa... Tenho duas garrafas do Salton Talento 2004 em casa. Elas vão valorizar, mas uma abrirei esta noite.

16/11/2007

7. Fórmula do bar perfeito

Definir a fórmula do bar perfeito é como definir a fórmula da música perfeita. Como dizer que o cardápio monotemático e mono-harmônico do hard rock do AC/DC *vídeo* ou do punk dos Ramones *vídeo* é menos música que a pauta elaborada e também revolucionária de um Bob Dylan *vídeo*? Com bares funciona do mesmo jeito. Em outras palavras, por que o (classudo e excelente) Baretto seria mais bar que o (roots e excelente) Elídio? De qualquer maneira, arrisco meu receituário: 1. boa bebida (o que inclui o jeito de servi-la); 2. bons garçons (ou o cara do balcão, tanto faz); 3. o público; 4. os petiscos (ou o que houver pra comer); 5. a ambientação (o que significa tanto a interna quanto a localização).
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NA FOTO: Bar Filial (Vila Madalena, São Paulo/SP)

14/11/2007

6. Canoinhense (cerveja)

Um senhor de 90 anos manda ver na mais antiga cervejaria artesanal do país. Rupprecht Loeffler tem dois funcionários e bebe 2 litros de cerveja por dia (6% do que produz). Um amigo trouxe exemplares para mim -- sim meu caro, para provar praticamente só indo até lá, mas já encontrei algumas no Frangó (em São Paulo). Sua linha tem 4 marcas (Jahu, Malzebier, Mocinha e Nó de Pinho). Todas são de baixo teor alcoólico (a Malzebier tem gradação em torno de 2%, as demais, pouco acima dos 3%). As cervas de seu Loeffler, em garrafas de 660ml, foram rebatizadas. A Jahu nasceu Cristal, mudou de nome em 1927. A Nó de Pinho ganhou seu nome em 1930, antes era Sport; a Malzebier é que é Malzebier mesmo, desde os anos 20. E tem a Mocinha, que é de 1950. Valem pelo sabor? Não. Mas valem muito pela história.

5. Dado Bier (cerveja)

Sai de um austero predinho marrom de 80 anos, no bairro Navegantes, em Porto Alegre, a linha de cervejas especiais Dado Bier, nascidas no fim de 2006. À frente dessa pequena usina está Eduardo Bier, 42 anos, um dos pioneiros na onda de microcervejarias que varre o país. Quem é do mercado calcula existir no Brasil perto de 70 empresas no segmento, e algo como 10% delas já tem suas versões em garrafa. O revival por esse tipo de cerva cresce acima de 50% a cada ano. Revival? De certo modo, sim: a primeira microcervejaria de que se tem notícia por aqui, a Canoinhense (veja post 6, 14/11/2007), surgiu em 1908 no interior de Santa Catarina. Hoje é tocada por Rupprecht Loeffler, mestre-cervejeiro de 90 anos (alguma dúvida de que as loirinhas fazem bem à saúde?). As quatro cervejas especiais Dado Bier encaram em pés (de cevada) de igualdade alguns já clássicos brasileiros como as marcas Baden Baden, Eisenbahn e Schmitt. Em sua ourivesaria, a Dado está atenta a detalhes que fazem os especialistas e amantes de cervejas gourmet acreditarem na salvação da raça humana, como buscar a água mineral de uma fonte a 35 quilômetros da planta industrial, trazer fermentos, lúpulos e maltes da Alemanha, dos Estados Unidos e da República Checa e adotar práticas na produção que lembram um alfaiate londrino. Neste fim de 2007, será lançada uma à base de mate (coisa de gaúcho, né?). Ainda não provei. Das que provei, avaliei assim (notas de 0 a 5):

Dado Bier Original
Teor Alcoólico (4,5%). Tipo (Pielsen/baixa fermentação). Vai bem com grelhados, frutos do mar, sushi, frango, salada. Avaliação: Aspectos Visuais (3.5); Aroma (3.5); Corpo (4.0); Sabor (3.0); Nota Final (3.5).
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Dado Bier Weiss
Teor Alcoólico (5,0%). Tipo (malte de trigo/alta fermentação). Vai bem com pratos picantes, como os da cozinha indiana e tailandesa. Avaliação: Aspectos Visuais (4.0); Aroma (4.0); Corpo (4.0); Sabor (3.0); Nota Final (3.8)
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Dado Bier Red Ale
Teor Alcoólico (5,3%). Tipo (Ale/alta fermentação). Vai bem com carnes e pratos temperados. Avaliação: Aspectos Visuais (4.0); Aroma (3.5); Corpo (4.0); Sabor (4.0); Nota Final (3.9).
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Dado Bier Royal Black
Teor Alcoólico (5,5%). Tipo (Bock/baixa fermentação). Vai bem com carnes e até sobremesas. Avaliação: Aspectos Visuais (4.0); Aroma (4.5); Corpo (4.5); Sabor (4.5); Nota Final (4.4).
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Como destaque, a aposta nos detalhes, iniciativa que garante a cada uma delas personalidade, sabores próprios e característicos. Como ponto negativo, ter seguido a tendência (para conseguir mais mercado) de cervejas "leves", mais fáceis de descer. A Devassa, do Rio, faz assim. Já a catarinense Eisenbahn arrisca mais, olha menos pro mercadão, e costuma criar brejas mais ricas.
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Publicado na revista VIP (novembro/2006)

4. Frangó (bar)

Frangó é cult. Se nascesse HQ, seria o Hagar. Numa antologia dos 100 melhores bares do país, ele deveria estar. Se a antologia fosse dos dez, poderia estar lá de novo. Pra quem não é de São Paulo, saiba que vale o esforço – leia-se enfrentar o trânsito e cruzar o rio Tietê em direção à Freguesia do Ó. (A propósito, a melhor ponte é a do Piqueri, não a da Freguesia, ok?) Por ser afamado, e ter esse DNA mais roots, o Frangó é invariavelmente citado, com ares de connaisseur, pela intelligentsia paulistana. Não se preocupe, porque ela não aparece lá tanto assim. Peça a coxinha. É mais celebrada que o frango grelhado, mas este é o verdadeiro moto-perpétuo da casa e melhor companhia para sua breja. Na entrada, à esquerda, há uma lousa com dicas de gringas em promoção. Você será um homem mais feliz se seguir o que o giz recomenda.
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Publicado na revista VIP (setembro/2007)

3. A Alma de um Chef (livro)

Como saber que se tem em mãos um grande livro? Ler Michael Ruhlman é um caminho. Escritor, jornalista e cozinheiro, ele juntou suas três personalidades para escrever A Alma de um Chef - Viagem para a Perfeição. O livro, dividido em três partes, poderia se chamar O Bom, o Mau e o Feio.

Na primeira parte, Ruhlman narra a trajetória de sete cozinheiros em busca do Certificado de Master Chef (CMC) do Instituto Americano de Culinária (CIA). Por dez dias, profissionais experientes são colocados à prova – e você não tem idéia do que é colocar à prova um chef, cara habituado a jornadas que facilmente chegam a 16 horas, sempre sob pressão, em ambientes apertados e quentes. De cada sete candidatos ao CMC, apenas dois passam. Chame essa primeira parte de thriller. Ou de O Feio – um lugar em que saber fatiar terrina significa tudo.

Na segunda parte, ele conta a história do Lola Bistrô, de Cleveland (Estados Unidos). À frente do restaurante está Michael Symon, que, eleito pela revista Food & Wine um dos dez melhores novos chefs dos Estados Unidos, virou celebridade. Enquanto a faixa de preço dos concorrentes de Symon estava entre 45 e 70 dólares/pessoa, ele fazia pratos que não passavam de 20 dólares, com média de gasto de 30 dólares/pessoa (o cara é de Cleveland!). Parte 2, ou O Bom.

Na parte 3, o autor mergulha no The French Laundry *vídeo*, de Thomas Keller (ranqueado pela revista Restaurant o quarto melhor do planeta em 2006). Autodidata, perfeccionista, messiânico, Keller já havia trabalhado em grandes cozinhas, teve certa fama e caiu. Para abrir The French Laundry, em 1994, precisou convencer 48 investidores. Tinha 41 anos e levou três temporadas para fazer algum dinheiro. Bem, “fazer algum dinheiro é um certo exagero”. No fim de 1996, sua casa lucrou 17 dólares (35 centavos de dólar por acionista). Mas a partir daí, sucesso. Keller, em ação, é exigente, pra dizer o mínimo. Chame esse trecho de O Mau.

Ruhlman encerra o livro da melhor maneira: com receitas. Tiradas dos personagens retratados no livro. É diversão completa. E de primeira.
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Publicado na revista VIP (outubro/2007)

2. Toro (restaurante)

Pedi com Signora P a paella de bacalhau do Toro. O Toro nasceu equivocado. Chique demais para um bar, caro demais para tapear e pretensioso demais como candidato a principal restaurante espanhol de São Paulo (apesar da poeira de mesmice dos lugares de sempre). Doses de humildade corrigiram muito bem o rumo. Até aquele vermelhão lábios de dançarina de cabaré já sumiu. Seu comando refez preços, o que sempre é boa notícia, e formatou a brigada que produz uma gastronomia espanhola vibrante. Sem Toro talvez não houvesse Eñe. Comece se divertindo com brincadeirinhas como queijo manchego e aquela charcutaria maravilhosa (pata negra, indiscutible) e depois vá pros arroces. Ah, diga "paelha", se estiver entre espanhóis. Quem diz "paeja" é argentino. Ou use a pronúncia que quiser, mas peça a sua.

1. Pizza

Pizza no I Vitelloni é filme de Fellini.